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Professor da EEL fala sobre as pesquisas na área da Nanotecnologia

Por Simone Colombo

 

Elas são partículas minúsculas, chegam a ter a espessura até 10 mil vezes menor do que um fio de cabelo, mas possuem superpoderes: são as nanopartículas de celulose, partes extremamente pequenas de matéria vegetal que têm se revelado como um dos maiores avanços tecnológicos dos últimos tempos.

 

Na Escola de Engenharia de Lorena (EEL), campus da USP em Lorena, no Laboratório de Biocatálise e Bioprodutos, estão sendo pesquisados novas rotas de obtenção e aplicação destas nanopartículas a partir de fibras celulose – o polímero natural mais abundante na Terra, de fonte 100% renovável, e encontrado no bagaço da cana-de-açúcar e o eucalipto, por exemplo.

 

O diferencial das pesquisas realizadas na EEL é o desenvolvimento de tecnologia de base biotecnológica para processos escalonáveis. Avanços nesta área podem viabilizar que estas nanopartículas sejam utilizadas como novas maneiras para conferir propriedades aprimoradas ou novas quando, por exemplo, associados à matriz polimérica, resultando em materiais com inúmeras possibilidades de aplicação.

 

A partir da celulose é possível obter dois tipos de nanopartículas: a celulose nanocristalina e a nanofibrilada.  A celulose nanofibrilada fica disposta em feixes paralelos organizados “como macarrões espaguete na embalagem”, enquanto a celulose cristalina (ou nanocristais) com aspecto de minúsculos bastonentes cristalinos “se assemelha à agulhas ou grãos de arroz, porém com espessura cerca de 200 mil vezes menor”, exemplifica o coordenador do grupo de pesquisa, Prof. Dr. Valdeir Arantes.

 

Os poderes da nanocelulose são decorrentes de uma combinação única de propriedades físicas, químicas e biológicas como elevada resistência mecânica, leveza, alta área superficial, biodegrabilidade, biocompatibilidade, entre várias outras. Arantes descreve que por isso, o interesse industrial para aplicação de nanocelulose abrange vários ramos industriais como o de papel, o têxtil, a construção civil, o alimentício, o biomédico, o farmacêutico, o de cosméticos, o setor automotivo, aeroespacial, eletrônico, entre outras. A indústria que mais tem investido em pesquisas na área é a de Papel e Celulose que busca diversificação no seu portfólio de produtos a partir da celulose. Uma das aplicações inovadoras da nanocelulose está na indústria de óleo e gás, já que a nanocelulose melhora a reologia dos fluidos de perfuração, reduz o atrito no revestimento dos poços de petróleo e devido à grande possiblidade de modificação, a celulose nanocristalina pode ser utilizada nas emulsões que estabilizam a interface óleo água. Na indústria de medicamentos, servem como carreadores para liberação controlada de fármacos. Devido a sua elevada transparência e poder ser eletricamente condutora, pode ser utilizada, por exemplo, como uma superfície para dispositivos eletrônicos flexíveis. Na medicina podem ser utilizados como curativo inteligente ou pele artificial na cicatrização de feridas e queimaduras, acelerando o processo de cicatrização. Com algumas propriedades similares ou até superiores às populares supermateriais como grafeno e Kevlar (usado em roupas à prova de bala), a nanocelulose com 8-10 vezes mais forte e mais leve que o áco inoxidável, por exemplo, é um material muito atrativo para as indústrias aeronáutica e automotiva. 

 

De acordo com o pesquisador, os estudos em Lorena estão focados em aplicar rotas ambientalmente corretas, mais eficazes do ponto de vista técnico, econômico, e ambiental e em encontrar meios biotecnológicos que possam liberar as nanoceluloses de modo que seja vantajoso tanto para indústria, quanto para o meio ambiente “estamos trabalhando para desenvolver processos biotecnológicos utilizando enzimas específicas e combinações diferenciadas que possam extrair essas nanopartículas de forma eficiente e com propriedades diferenciadas.” Declara Arantes.

 

Além da procura por um método ambientalmente aceitável e menos oneroso para extração das nanopartículas de celulose, o grupo também trabalha no desenvolvimento de técnicas que possibilitem a incorporação eficiente de nanocelulose em matrizes poliméricas (os famosos compósitos e nanocompósitos). Busca-se criar o que Arantes chama de superplástico ou plásticos inteligentes, com melhores propriedades de barreira, biodegradabilidade, mais leve e mais resistente que os convencionais. Esse supermaterial poderá ser utilizado para embalagens alimentícias, componentes plásticos automobilísticos, ou embalagens em geral, um setor em constante crescimento em decorrência da expansão do e-commerce.

 

Nesta linha de aplicação de nanocelulose, recentemente as pesquisas realizadas no Laboratório de Biocatálise e Bioprodutos da EEL tiveram destaque no “Fibria Insight”. Um programa de inovação aberta , oferecido pela Fibria, para identificar e estimular soluções inovadoras e novas oportunidades de negócio em parceria com outras instituições. Entre 50 inscritos, o projeto da EEL foi um dos 7 finalistas escolhidos para desenvolver, junto à empresa, aplicações inovadoras para a celulose microfibrilada produzida na planta piloto da empresa em Aracruz.

 

Em um sistema de imersão com o objetivo de proporcionar reais oportunidades de negócios, o programa ofereceu, através de uma aceleradora de startups em Belo Horizonte, um leque de conhecimentos e suporte aos participantes (15 pré-selecionados) focando em: visão de custos, informações sobre linguagem comercial, propriedade intelectual, valorização de tecnologia e plano de negócio.  Arantes participou do programa representando a equipe composta por Braz Marotti e Gabriela Berto, alunos de Doutorado orientados do professor no programa de Biotecnologia Industrial da EEL. A equipe vê essa oportunidade como uma proveitosa aproximação do universo da pesquisa acadêmica da realidade industrial, o que é muito benéfico para universidade, pois dá ao docente uma amplificada visão de mercado e negócios. “A nossa participação, além de aproximar a pesquisa acadêmica da indústria, abriu novas portas para parcerias e troca e compartilhamento de conhecimentos. Foi uma satisfação enorme poder participar desse desafio tecnológico e levar o nome da USP para uma competição de grande visibilidade”.

 

A etapa final seleção foi realizada no mês de dezembro de 2017 e analisou de perto o potencial inovador e de negócio de cada projeto. A classificação do projeto da EEL entre os finalistas resultou em uma parceria entre a USP de Lorena e a Fibria. Essa parceria prevê o desenvolvimento em conjunto de uma tecnologia que irá resultar na aplicação de micro/nanocelulose para obter embalagens plásticas mais resistentes e mais leves, inteligentes e com menor impacto ambiental.  Além disso, o encontro com outros pesquisadores na área durante o programa decorreu em uma outra parceria da EEL com o Instituto Federal do Amazonas, com a participação em um outro projeto finalista no programa para aplicação de micro/nanocelulose na área de sensores flexíveis para geração de energia.

 

A nanocelulose com sua alta performance e versatilidade, é uma aliança entre nanotecnologia, biotecnologia e matéria-prima renovável.

 

Por toda essa versatilidade e potencial de ser produzido à baixo custo, pesquisas em nanocelulose tem atraído atenção das indústrias do mundo todo. Países como Canadá, Finlândia, e EUA têm investido pesadamente nesta nova tendência mundial de mercado. “Há uma grande expectativa no setor industrial de que a nanocelulose será o próximo supermaterial que irá mudar o mundo num futuro próximo” conta Arantes.